segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014
Homesick Blues
O quão triste é alguém sentir falta dos bares que frequentava?
A nostalgia é um senhora que se masturba pensando nos piores amantes que já teve.
sábado, 8 de fevereiro de 2014
Estar Sozinho
Estar Sozinho
(Charles Bukowski)
Quando você pensa em quantas vezes
tudo dá errado
você começa a olhar para as paredes
e permanece lá dentro
porque as ruas são o
mesmo filme antigo
e todos os heróis acabam como o
velho herói do filme:
bunda gorda, cara gorda e o cérebro
de um lagarto.
Não é de admirar que
um homem sábio irá
escalar uma montanha de 10.000 pés
e sentar-se lá esperando
e vivendo de baga de arbusto
em vez de apostar em duas covinhas dos joelhos
que certamente não vão durar a vida inteira
e 2 em cada 3 vezes
não sobreviverá por uma noite.
Montanhas são difíceis de escalar.
as paredes são suas amigas.
conheça suas paredes.
O que eles nos deram lá fora
é algo que mesmo as crianças
se cansaram.
Permaneça com suas paredes,
elas são seu amor mais verdadeiro.
Construa onde ninguém constrói.
É o último caminho que resta.
(Imagem: Peter Lorre as Raskolnikov, "Crime e Castigo", de Lusha Nelson)
quarta-feira, 29 de janeiro de 2014
"Ele nada compreendia desse insondável mistério que é a existência humana, individual ou coletiva; que escapava ao seu entendimento a mais ínfima malha desse inextricável e infinito emaranhado destes milhões de destinos individuais que se entrecruzam e se separam por artes do acaso; que o mundo provavelmente não tem, a rigor, nenhum sentido (e aqui reproduzia, de memória, confusa citação) 'porque, possivelmente, tudo que existe é fragmentado, incompleto, abortado; eventos com término mas sem começo; outros com apenas o segmento intermediário; coisas que tem a parte anterior ou a posterior, mas não ambas; e tudo isso boiando como num prato de sopa, non qual vez ou outra alguns fragmentos se juntam por acaso para formar um todo'; que somente a Razão alucinada pode pretender ser possível ordenar esse caos, descobrir causalidades nessa infinita cadeia de acidentes".
- Edmundo C. Coelho, "Crônica da Sociologia Assassinada ou Ao Mestre, com Carinho".
Raduan Nassar, Jorge Luis Borges, Baudelaire e, agora, Edmundo Campos, não deixando eu me sentir tão sozinho....
sábado, 25 de janeiro de 2014
Cigano*
Num outono qualquer, ele aprendeu a ler mãos. De
terceiros. Mas nada de linhas, eram as mãos seres autônomos, independentes do
resto do corpo, cheias de vida própria e desejos tão incompreensíveis quanto
reveladores. Os movimentos, a superfície da pele, os toques, a cor, o cheiro,
tudo nas mãos lhe surgia como uma ligação do indivíduo com o infinito. Haviam
mãos cansadas pelo labor diário que constrói a máquina; mãos furtivas que
perturbam a paz de quem se deixa tocar; as assassinas e as inquietas, que
determinam a danação de seus donos; mãos com estilo, belas como o olhar
misterioso dos gatos; Bastava olhar para dois amantes de mãos entrelaçadas e
saberia dizer quando se separariam. Podia ver alguém dedilhando uma guitarra e
saberia qual o blues mais adequado. Dependendo do modo como uma mão de dedos
longos e unhas vermelhas segurava um cigarro, poderia dizer se ela era feliz.
Leu as mãos de todos os seus amigos, e lhes trouxe boas novas. Leu as mãos de
empresários, e previu suas falências. Leu as mãos de loucas, dançarinas,
prostitutas e escritoras e se apaixonou por todas elas. Mas não podia ler as
próprias mãos. Tentou diversas manhãs, duzentas madrugadas, mas não conseguia.
Tentou ensinar seu dom a sua amante, mas tudo em vão. Uma noite, sentado à
beira-mar, com uma garrafa de vodka, passou quatro horas e vinte e três minutos
observando as próprias mãos, e só via marcas de cigarro, sinais de nascimento,
pontas de dedos amareladas e furos de agulha. Esvaziou a garrafa, e chorou.
Nunca mais souberam dele. Mas uma vez ou outra surgem estórias de um homem em
algum lugar, não se sabe se no Amazonas ou no Marrocos, capaz de beijar sua mão
como se adivinhasse um segredo.
*Republicado com alterações.
quinta-feira, 23 de janeiro de 2014
"No more going to the darkside with your flying saucer eyes/No more falling down a wormhole that I have to pull you out/The wroggling, squiggling worm inside/Devours from the inside out/No more talk about the old days, it's time for something great/I want to get out and make it work/So many lies/So feel the love come off of them/And take me in your arms."
quarta-feira, 22 de janeiro de 2014
Senso Comum
Assim choram os homens:
Escondidos
e as mãos encharcadas de lágrimas
são enxutas nos lençóis que contem
sobras de noites que ficaram para trás,
e que gritam como os internos de uma casa de custódia.
É de conhecimento geral:
não há desespero em vão, e depois da tempestade
sempre esperamos (...)
E esperamos.
Todos sabem – os pássaros não voam para o lado certo
por senso de direção:
- É instinto de sobrevivência.
R.
R.
terça-feira, 21 de janeiro de 2014
Minas
(Ana Martins Marques)
Se eu encostasse
meu ouvido
no seu peito
ouviria o tumulto
do mar
o alarido estridente
dos banhistas
cegos de sol
o baque
das ondas
quando despencam
na praia
Vem
escuta
no meu peito
o silêncio
elementar
dos metais
sábado, 18 de janeiro de 2014
Hotel das Estrelas
Algumas pessoas não percebem que
estavam perdidas até que estejam enfim trilhando o caminho correto. O contrário
também pode acontecer, e a descoberta raramente é indolor. Nenhum deles dois
esperava que aquela fosse uma noite comum, mas tampouco esperavam a madrugada
ardente e corrosiva que os consumiria num hotel barato onde encontrariam
redenção. Abrigo enfim dos perigos sobre os quais tanto falaram em suas
conversas que seguiam noite adentro à distância. Eles foram para o bar como
dois amigos que não se viam há tempos, ainda que no passado deles existisse uma
marca, uma pequena cicatriz deixada por um encontro que eles preferiram, mais
por receio que por educação, ignorar ao se abraçarem passados dois anos. Mas,
se fizeram isso pensando que seu encontro não reacenderia aquele fogo antigo, a
pequena chama que nasceu numa noite de ano-novo qualquer, enganaram-se
clamorosamente. Demorou pouco para que nem todas as cervejas geladas pudessem
baixar suas temperaturas corporais e que qualquer recato impedisse o tráfico de
olhares e toques furtivos de mãos e pernas que não tardariam a se transformar
em beijos. Digamos que tenha sido apenas tempo o suficiente para falarem das
desventuras que se abateram sobre ambos, algumas alegrias que vieram e pudessem
confirmar que ainda se alegravam na presença um do outro. Nada mais precisava
ser dito, apenas feito. E eles fizeram. Da melhor maneira, no pior hotel,
esquecendo seus pudores no bar recém-deixado e sujaram-se com cada gota que
pingava de seus corpos penetrando-se mutuamente, ela com sua língua na boca
dele, seus gemidos em seus ouvidos, suas unhas em sua carne e ele buscando à
vontade os orifícios dela que lhes dessem prazer, seu pau indo e vindo de sua
buceta úmida e quente, seus dedos procurando seu rabo e seus dentes marcando
seu pescoço tudo isso sob a luz das estrelas que teimavam em entrar pela janela
aberta junto com o vento, o único capaz de trazer algum resquício de frescor na
noite abafada naquele hotel e devorando-se pedaço por pedaço amanheceram enfim um
dia em chamas que se prolongou além do sol nascente.
O que veio depois, entretanto,
transformou esta noite em um sonho distante que por vezes parece não ter
acontecido. Aos poucos os amantes foram se descobrindo dois estranhos sem ter o
que compartilhar. Quando essa percepção abateu-se sobre os dois é difícil
precisar mas o fato é que eles não conseguiram mais se ver ou conversar como
antes. Ainda assim, algo permanecia grudada a ela feito um parasita a
roubar-lhe as energias, a lembrança dele e daquela noite sobreviveram de algum
modo nela, e se a mente não reconhecia naquele homem o mesmo que a desbravara
com doçura selvagem, seu corpo ressentia-se de sua ausência. Uma noite,
alucinada pela falta que aquele agora estranho fazia a ela, depois de masturbar-se
mais de uma vez sem conseguir criar uma imagem sequer dele, porém sabendo
exatamente em que pensava, ela saiu de casa. Acreditou estar sem rumo, mas em
algum momento de sua jornada sua consciência retornou e ela reconheceu o
trajeto que fazia: caminhava na direção daquele hotel. Subiu as escadas
enquanto um calafrio percorria sua espinha e sentia-se cada vez mais
lubrificada. Pediu à atendente o mesmo quarto e lá se deitou. A maneira como se
satisfez assustou-a, mas aquela seria sua primeira noite de sono tranquila
desde que ele se foi.
Ele, no entanto, não pareceu
sofrer do mesmo mal. Parecia indiferente à estranha distância que se pôs entre
os dois. Partiu de volta para sua cidade sem falar com ela. Lembrava daquela
noite sempre com um sorriso no rosto, mas curiosamente distinguia os
acontecimentos mais tórridos do hotel da mulher que sujeitou-se ativamente a
seu desejo, que cavalgou-lhe impetuosamente e que colhera em sua boca o seu
fruto. Em suma, lembrava-se da canção, mas ignorava a cantora. Recebeu em seu
e-mail os detalhes da noite em que ela sozinha havia ido até o hotel das
estrelas. Tratou o fato como uma leve excentricidade, sem maior peso e sem se
dar conta do desespero que se abatia sobre ela. O tempo passou e a memória
daquela noite se esvaia de sua mente. Demorou um ano até que voltasse à cidade.
Ele já não era o mesmo, nem a cidade. Não se animava com a possibilidade de
reencontrar conhecidos, antigos casos, velhos lugares. Algum impulso o fez
ligar para ela – a velha convicção masculina de que ela sempre estará lá,
esperando-o. Ela disse que o encontraria, mas não sabia quando. Os dias se
passaram, o momento em que ele partiria novamente se aproximava e ela não dava
sinais de que apareceria, e aquilo ia causando uma sensação estranha nele. A
cada noite, a lembrança dela se tornava mais nítida. Seu corpo, sua boca, suas
curvas, até mesmo sua voz. Não conseguia falar com ela. Solitário, ébrio, uma
noite procurou-a ativamente sem sucesso. Seu coração fazendo menção de saltar
de seu peito a qualquer instante. Uma saudade repentina de todos os lugares
pelos quais havia passado com ela. Passou pelos mesmos bares, pela mesma orla,
até se encontrar em frente ao hotel em que treparam pela última vez. Lembrou-se
do e-mail dela. Tentou lutar contra a força que o havia levado até ali, mas se
viu incapaz de resistir e em pouco tempo estava deitado sobre a cama e seus
lençóis suspeitos, no mesmo quarto em que ela estivera meses atrás e poderia
jurar que sentia seu cheiro. Não conseguia mover-se, nem mesmo para se
masturbar, ainda que as lembranças estivessem mais claras que nunca. Chorou
como há muito não fazia, copiosamente, digno de pena. Passou uma noite inteira
acordado. Pensava apenas na ironia perversa que subjazia à punição que recebia
graças a seu cinismo e descrença. Quando o sol entrou pela janela aberta,
encontrou-o estático, com certo sorriso triste a enfeitar-lhe a face.
quarta-feira, 15 de janeiro de 2014
Aos descuidados a flor da pele
Só não ando por aí carregando meu coração na mão
porque esqueceria-o na mesa do bar.
segunda-feira, 6 de janeiro de 2014
quarta-feira, 1 de janeiro de 2014
Para o Ano Novo
Precisava de algum dinheiro para
ter paz. Garantir-me o café, os cigarros, as cervejas e as entradas para o
cinema nos dias que viriam. Foi com isso em mente que me preparei para a virada
do ano. Minha camisa azul displicentemente abotoada sobre meu corpo, a calça
branca, colar no pescoço, um digno filho de Iemanjá, parti para a praia naquele
dia 31. Eu fui para a praia porque precisava de algum dinheiro para ter paz.
Para enviar as cartas que escrevi com tanto esforço e sinceridade sobre-humana.
A garrafa de vinho pela metade foi enfim esvaziada porque eu não precisava
estar sóbrio para o que iria fazer. O vinho é um licor que só pode ser
apreciado se você se deixa possuir por ele. Permiti. E Decidi que iria
caminhando até a praia. Mentira. Eu não tinha dinheiro. Era por isso que estava
indo. Para colocar em prática o desonesto e mau-caráter plano. No caminho, nas
ruas, toda a euforia ritualística do ano-novo. Todos pareciam felizes, menos eu,
mas é claro que as aparências enganam. Eu estava apenas melancólico. Porque fim
de ano é assim mesmo. Lembrava que há algum tempo que não me apaixonava, e isso
definitivamente não era bom. Se cicatrizes são boas lembranças, feridas abertas
não são boa coisa, são piadas que perdem a graça muito fácil. Somente as
paixões me fazem parar de cutucar essas feridas do amor. E eu não tinha
nenhuma. Falo de paixões, não de feridas. Mas essa cidade possui atalhos, eu já
conheço alguns deles, e antes que essas dúbias reflexões pudessem ameaçar
minhas intenções, como num passe de mágica, tenho a minha frente o mar, seus
perigos. Vejo-o de cima, e sinto-me altivo. Quantas vezes já o desafiei? Até
aqui, venci. Não o temo, ainda que o venere. O mar não é Deus. Vejo também as
pessoas. Milhares delas. Dezenas de milhares. Centenas de milhares. Ainda falta
algum tempo para a hora certa. Sento-me à beira do mar infinito. Retiro o colar
do meu pescoço e entrego em
oferenda. Brinco com as ondas que chegam até meus pés. Estou
vestido com a graça formidável dos indecisos. Será que devo. Claro que devo.
Estou jogando, entenda. É preciso arriscar. E eu necessito de dinheiro. Para
ter paz. Acendo um cigarro – ele sempre está, e sempre estará nessas minhas
histórias – e percebo alguém se aproximando. Uma pessoa bem-vestida, cores
diversas nos tecidos que vestem seu corpo e nas tatuagens que vestem sua pele.
Ela me pede um cigarro. Acende. Com toda a sensualidade com que um cigarro
merece ser aceso, nenhum gesto desperdiçado, mãos, boca, olhos, até mesmo os
cabelos conspirando para uma fotografia perfeita da beleza esfumaçada de um
fumante. “O mar não se acalma, mesmo à noite”. Pronuncia essas palavras e sai.
Fumo meu cigarro; quase disse que essa agitação do mar é apenas na superfície,
talvez ele tente nos intimidar para não penetrarmos nele, mas sob essas ondas
está uma paz inigualável e é para lá que quero ir quando morrer. São quase
meia-noite. Quando chegar a hora, fogos de artifício agitarão o céu, e todas
essas pessoas que vieram de longe para vê-los, estarão com seus olhos vidrados
no céu, e bolsas e carteiras estarão à mercê de mãos habilidosas. E eu as
tenho. Ela dizia que eu tinha mãos habilidosas. Mas agora que minhas mãos já
não servem para moldá-la em prazer, como quem toca a argila molhada, deixo para
utilizá-las em outros movimentos sutis, como bater bolsos alheios. Os fogos
estouram na grande noite do avô ancestral, eu me movo como um sussurro por
entre os distraídos, levando o que consigo. Mas havia alguém que não olhava o
céu. Alguém entediado. Detenho-me ante essa figura. Estou olhando fixo em seus
olhos, a desafio como desafio o mar. Sou beijado, sinto o gosto do cigarro que
presenteei em seus lábios.
É manhã, volto para minha casa
com tudo aquilo que precisava para minha paz: Dinheiro, promessas e um coração
deixado na areia da praia.
terça-feira, 31 de dezembro de 2013
Delirium Tremens
Sinto sua mão ausente desembaraçar
meus cabelos e seu hálito quente sopra em minha nuca ainda que nunca estejas
realmente aqui. Seus seios roçam suavemente minhas costas nuas, seus arrepios
são meus arrepios eu pressinto o pior conforme sua mão desliza pelo meu ventre.
Mordes com força meu pescoço e sequer deixa a marca de teus dentes como
lembrança, maldita. Sinto seus dedos dentro de minhas calças e se minha mente
já não tolera o peso insuportável de sua ausência tirânica o que dizer de meus
nervos insistindo nestes impulsos de gozo e de aflição que me tomam ao lembrar
seu nome, da palidez de sua pele? “Tenho você sob minha pele” não é mais uma
metáfora quando cravas as unhas em minha virilha e sussurra meu nome, eu me
reviro na cama, solitário, indo e voltando, a respiração cada vez mais pesada
como se você segurasse meu pescoço forçando um orgasmo ainda mais intenso, uma
sensação violenta de morte – umedece os lençóis, transtorna minhas roupas,
sangra minha carne e você ainda assim não está aqui.
segunda-feira, 18 de novembro de 2013
Aqueles que Rezam em Silêncio
Ele não sabe o que dizer para ela, e não é porque seja um animal que não possa verbalizar o que sente, ele apenas teme que exista algo de intrinsecamente maligno em suas palavras que possa, como uma bigorna desabando sobre uma fina superfície de gelo, fazer em pedaços tudo o que existe entre eles até então. Alguns homens já testemunharam horrores demais causados por eles enquanto tentavam fazer o melhor; outros de nós já fomos responsáveis por tanta dor e loucura de outras mulheres quando acreditávamos estar apenas nos divertindo que a mera presença da mulher que francamente amamos afugenta nossa coragem; outros ainda aprendem cedo demais que possuem uma dívida para com o gênero feminino que é irreparável e inegociável e só o que resta é se calar; outros são lutadores cansados que esperam sempre o último bater de porta e barulho de saltos na escada como se esperassem o golpe final que os derrubará; há homens que se debatem na cama e acordam com a sensação de terem falado durante o sono algo que não deveria ser dito, e se calam por medo que suas palavras desencadeiem a derradeira briga; em comum, nós homens apenas não nos acostumamos a falar de nossos sentimentos e tememos sempre expressar da forma errada um sentimento que é incomunicável, tentamos fazer com que o afeto seja sempre algo físico, que possa ser expresso por meio de toques, abraços apertados, beijos, lambidas, arrepios, ereções, empurrões desastrados, socos na parede, cortes dos copos que se quebram em nossas mãos, gritos primais que irradiam uma violência que já associamos à virilidade. Não se trata de covardia, mas, de uma limitação que desde cedo consideramos uma demência cognitiva incurável, que nos acompanhará de lar em lar, de copo em copo, de bar em bar, de relacionamento em relacionamento, nos lembrando que somos animais e que o mal mora dentro de nós não importa o quanto rezemos, o quanto fujamos. Homens se calam, alguns até reverenciam o silêncio, porque se sentem seguros assim. Aí mora o motivo de sua danação. O sentido trágico de suas vidas. Alguns, inconformados com seu destino, rebelam-se, gritam, quebram pratos, culpam a vítima, partem para o ataque, agridem, atacam com violência quem juraram proteger. Outros, mais resignados, acendem cigarros e cantarolam baixinho enquanto elas dormem. E pedem ao Deus que eles nem sabem se existe para que, quando acordem, aqueles anjos não façam perguntas, ou que aquele momento possa durar para sempre.
segunda-feira, 11 de novembro de 2013
Cigarette in your Bed
"Strange stare
Strangled by the blade left
In your heart
I glide by
Slip a cigarette"
MBV
quinta-feira, 7 de novembro de 2013
Rotina
Ilustração: xkcd
Acordou, e ao perceber que ainda faltavam 20 minutos para o horário que havia decidido acordar, voltara a dormir. Teve um pesadelo envolvendo uma casa abandonada, ratos do tamanho de Poodles e Justin Bieber gritando histericamente. Acordou assustado e logo se deu conta de que não ouviu o despertador. Pensou se seria possível a voz estridente do astro teen num sonho abafar a musica dos Smiths no celular no mundo real. Deixou logo de lado essas elucubrações, levantou-se e preparou um café forte. Enquanto esperava ele ficar pronto, puxou o livro de Manuel Bandeira à procura de um poema e releu "Pneumotórax". Em seguida, "Poética", seu preferido. Pensou que deveria compartilhar ele com mais gente. Abriu o facebook. O café ficou pronto. Se serviu, trouxe a cafeteira para próximo de si, junto ao computador, passou geleia em duas fatias de pão de forma e sentou-se novamente. Navegou por uns instantes pelas postagens de seus contatos. Duas pessoas davam "bom dia" a quem quer que estivesse on line. Um outro compartilhava um link sobre a importância da desmilitarização da polícia. Outro, uma montagem de gosto duvidoso em que homens de terno em cima de um palanque eram colocados atrás de grades e a mensagem em letras garrafais dizia: "Cadeia Para os Condenados no Mensalão". A inadequação ortográfica da mensagem o incomodava demais, pensou em comentar isso, mas decidiu que quem está preocupado com o mensalão não deve ter muito tempo pra gramática. Havia um texto sobre as tais manifestações de junho, mas era longo e parecia ser enfadonho, também. Enfim, haviam pessoas criticando a política externa norte-americana, o jornalismo brasileiro, a futilidade moderna, o show do Justin Bieber (ele, mais uma vez), defesas do comunitarismo, do amor livre e do Caetano Veloso. Se pergunta qual o sentido daquilo tudo. Tantas pessoas militando numa rede social em prol de alguma coisa, cada um com sua causa. Riu da frase espirituosa. Todos preocupados com algum problema, mas gostando que os outros também estejam preocupados com outros problemas, num eterno ciclo de compartilhar e curtir. Aliás, está certo chamar isso de compartilhar? Os problemas (e links, fotos, montagens, textos, etc ad infinitum) são compartilhados ou publicados por narcisismo e carência? Vai saber. Fato é que as pessoas parecem mesmo dar importância a isso e quem publica coisas sérias tem muito mais pontos na corrida por status aqui. Riu ao lembrar dos discursos que culpam as redes sociais por ilhar as pessoas em seus próprios casulos sob a ilusão de interação e integração. Quanta bobagem. Até onde ele consegue entender, as redes sociais amplificaram uma característica antiga dos agrupamentos humanos: A tendência à elaboração de papos de surdos e mudos em que ninguem diz nada e ninguem escuta nada. Algo como uma assembléia geral de Ciências Sociais elevada à enésima potência. Riu mais uma vez. Terminou o café. Lembrou do trabalho. Desistiu de publicar o poema. Fechou o livro do Bandeira. Sorriu, triste e satisfeito. O dia começou.
quarta-feira, 6 de novembro de 2013
Cherry
Tasty - Jen Mazza
Ela gosta de chupar dedos
Morder pescoços
Lamber dorsos
E devorar sonhos.
Deixo-a fazer o que quiser.
A Índole da Multidão
(Charles
Bukowski)
Há suficiente traição, ódio,
violência,
Absurdo no ser humano comum
Para abastecer qualquer exército a qualquer
momento.
E Os Melhores Assassinos São Aqueles
Que Pregam Contra o Assassinato.
E Os Melhores No Ódio São Aqueles
Que Pregam Amor
E Os Melhores Na Guerra
-Enfim- São Aqueles Que Pregam
Paz
violência,
Absurdo no ser humano comum
Para abastecer qualquer exército a qualquer
momento.
E Os Melhores Assassinos São Aqueles
Que Pregam Contra o Assassinato.
E Os Melhores No Ódio São Aqueles
Que Pregam Amor
E Os Melhores Na Guerra
-Enfim- São Aqueles Que Pregam
Paz
Aqueles Que Pregam Deus
Precisam de Deus
Aqueles Que Pregam Paz
Não Têm Paz.
Aqueles Que Pregam Amor
Não Têm Amor
Cuidado Com Os Pregadores.
Cuidado Com Os Conhecedores.
Precisam de Deus
Aqueles Que Pregam Paz
Não Têm Paz.
Aqueles Que Pregam Amor
Não Têm Amor
Cuidado Com Os Pregadores.
Cuidado Com Os Conhecedores.
Cuidado
Com Aqueles
Que Estão Sempre
Lendo
Livros
Com Aqueles
Que Estão Sempre
Lendo
Livros
Cuidado Com Aqueles Que Ou Destestam
A Pobreza Ou Orgulham-se Dela
A Pobreza Ou Orgulham-se Dela
Cuidado Com Aqueles Rápidos Em Elogiar
Pois Eles Precisam de Louvor Em Retorno
Pois Eles Precisam de Louvor Em Retorno
Cuidado Com Aqueles Rápidos Em Censurar:
Eles Temem O Que
Desconhecem
Eles Temem O Que
Desconhecem
Cuidado Com Aqueles Que Procuram
Constantemente
Multidões; Eles Não São Nada
Sozinhos
Multidões; Eles Não São Nada
Sozinhos
Cuidado
O Homem Vulgar
A Mulher Vulgar
Cuidado Com O Amor Deles
O Homem Vulgar
A Mulher Vulgar
Cuidado Com O Amor Deles
Seu Amor É Vulgar, Busca
Vulgaridade
Mas Há Força Em Seu Ódio
Há Força Suficiente Em Seu
Ódio Para Matá-lo, Para Matar
Qualquer Um.
Vulgaridade
Mas Há Força Em Seu Ódio
Há Força Suficiente Em Seu
Ódio Para Matá-lo, Para Matar
Qualquer Um.
Não Esperando Solidão
Não Entendendo Solidão
Eles Tentarão Destruir
Qualquer Coisa
Que Difira
Deles Mesmos
Não Entendendo Solidão
Eles Tentarão Destruir
Qualquer Coisa
Que Difira
Deles Mesmos
Não Sendo Capazes
De Criar Arte
Eles Não
Entenderão A Arte
De Criar Arte
Eles Não
Entenderão A Arte
Considerarão Seu Fracasso
Como Criadores
Apenas Como Falha
Do Mundo
Como Criadores
Apenas Como Falha
Do Mundo
Não Sendo Capazes De Amar Plenamente
Eles Acreditarão Que Seu Amor É
Incompleto
Então Te Odiarão
Eles Acreditarão Que Seu Amor É
Incompleto
Então Te Odiarão
E Seu Ódio Será Perfeito
Como Um Diamante Brilhante
Como Uma Faca
Como Uma Montanha
Como Um Tigre
Como Cicuta
Como Um Diamante Brilhante
Como Uma Faca
Como Uma Montanha
Como Um Tigre
Como Cicuta
Sua Mais Refinada
ARTE.
ARTE.
segunda-feira, 4 de novembro de 2013
Jornada
A placa pela qual passamos indicava
algo que talvez fosse um atalho, mas pensamos logo
que se tratava de uma rua sem saída.
E, assim, seguimos.
A porta que atravessamos prometia
ser uma saída, mas
ela se trancou atrás de nós e era uma armadilha.
ela se trancou atrás de nós e era uma armadilha.
O caminho que tomamos a seguir era cheio de perigos
e mesmo assim o trilhamos
empolgados e iludidos com uma visão que
tivestes em teus sonhos
de um lugar para repousar nossos ossos;
Mas o oásis ao qual chegamos estava
infestado de baratas, pulgas, relógios
carteiras e homens de negócio, e sua água
contaminada por todos estes tristes seres
e assim, o abandonamos.
Tristes e sozinhos, caminhamos a esmo
caminhamos sob a lua cheia entoando canções
e escrevendo poemas no vento,
nossa dor maior que nossos corpos e
nossa sede tão infinita quanto um deserto.
Não possuíamos água, comida ou teto,
apenas a escolha que fizemos e um ao outro,
corpos exauridos e mentes que divagavam,
e a alegria de quem deixou tudo para trás.
A travessia foi longa, deixou marcas
em nossos corpos
Não haviam saídas ou retornos que não implicassem
em algum tipo de traição.
A solução que encontramos diz respeito apenas
a nós mesmos
inscrevê-la aqui não nos faria menos
profanos
Acordamos com o barulho que entrava pela janela
constrangidos, mas orgulhosos,
mal reconhecendo a nós mesmos no
espelho manchado de um quarto qualquer.
E em teus olhos a mesma lágrima,
furtiva,
que todas as manhãs teimo em arrancar-lhe
com um beijo.
de um lugar para repousar nossos ossos;
Mas o oásis ao qual chegamos estava
infestado de baratas, pulgas, relógios
carteiras e homens de negócio, e sua água
contaminada por todos estes tristes seres
e assim, o abandonamos.
Tristes e sozinhos, caminhamos a esmo
caminhamos sob a lua cheia entoando canções
e escrevendo poemas no vento,
nossa dor maior que nossos corpos e
nossa sede tão infinita quanto um deserto.
Não possuíamos água, comida ou teto,
apenas a escolha que fizemos e um ao outro,
corpos exauridos e mentes que divagavam,
e a alegria de quem deixou tudo para trás.
A travessia foi longa, deixou marcas
em nossos corpos
Não haviam saídas ou retornos que não implicassem
em algum tipo de traição.
A solução que encontramos diz respeito apenas
a nós mesmos
inscrevê-la aqui não nos faria menos
profanos
Acordamos com o barulho que entrava pela janela
constrangidos, mas orgulhosos,
mal reconhecendo a nós mesmos no
espelho manchado de um quarto qualquer.
E em teus olhos a mesma lágrima,
furtiva,
que todas as manhãs teimo em arrancar-lhe
com um beijo.
sexta-feira, 1 de novembro de 2013
Carta
(Leonard Cohen)
O modo como assassinaste sua família
nada significa para mim
enquanto a tua boca percorre meu corpo
Eu conheço os teus sonhos
de cidades arrasadas e cavalos em fúria
do sol demasiado perto
e da noite sem fim
Mas isso nada significa para mim
ante o teu corpo
Sei que lá fora uma guerra ruge
que tu transmite ordens
e bebês são afogados e generais degolados
Mas o sangue nada significa para mim
pois não altera tua carne
Que tua língua saiba a sangue
não me surpreende
enquanto meus braços crescem no teu cabelo
Não penses que não compreendo
o que acontece
depois de as tropas serem massacradas
e as putas passadas à espada
Escrevo isto só pra te roubar o prazer
quando uma manhã a minha cabeça
estiver dependurada com as dos generais
do portão da tua casa
Só para que saibas que previ tudo
e que isto nada significa para mim.
- Extraído do livro "Filhos da Neve - Antologia poética".
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Deixa eu bagunçar você
Durmo na esperança de sonhar contigo Acordo somente pro desejo de te encontrar Menos que obsessivo, meu amor por você é abrigo ...

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Qualquer lugar pode servir de palco para o espetáculo ardente de amantes inebriados nós já sabemos disso, e até mesmo oferecemos n...
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Durmo na esperança de sonhar contigo Acordo somente pro desejo de te encontrar Menos que obsessivo, meu amor por você é abrigo ...
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Você sequer para pra pensar se deve ou não tentar resistir a certo sorriso. Como o dela, que dissipa certezas, que convida à proximidade ...