Pois ele buscava o mar. Enquanto cruzava longas distâncias sob o sol de outubro e olhares curiosos, vislumbrava em delírios o momento em que encontraria aquilo que ele só entendia como sendo uma rota de fuga definitiva e adequada para longe dos mares revoltos de sua consciência turva, ou talvez como seu ondulante leito de morte, de qualquer modo é ele, o Oceano sua perfeita imagem da beleza e eternidade, altar ou túmulo, a um só instante. Um instante líquido, agitado e profundo, como tudo em sua vida, sua tristeza, amores e gozos, todos líquidos, agitados e profundos.
Seus dedos dos pés, havendo recém-tocado a areia, contraíram-se de maneira angustiada diante da soberania vasta do mar, enquanto seus olhos se fechavam em reverência. E de olhos fechados, subitamente o mar se calou, sua violência se interrompendo num silêncio que fere. A brutal mudez oceânica, como duzentos cadáveres cobrindo uma planície descampada, como um grito sufocado no meio da madrugada, como uma porta deixada aberta por quem acabou de partir.
Frio como um infindável esquife de gelo.
Em meio a soluços e lágrimas, ele pronunciou uma oração que sequer compreendia. Não é de nossa natureza se agarrar ao mistério quando tudo que é óbvio não parece mais surpreender? Ele acreditava que sim, e foi por isso que naquela noite, enquanto crianças nasciam, bêbados se perdiam voltando para casa, casais se beijavam e toda a dor do universo parecia ser curada com um simples sax jazzístico, ele se atirou ao mar silencioso em comunhão com a única coisa que, supunha ele, pudesse afogar sua solidão, infinita,
A lua assassina escondeu sua face esta noite.
Certas tristezas não devem ser testemunhadas nem mesmo por uma divindade tão antiga como Selene.
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