terça-feira, 30 de julho de 2013

Borboleta de Asas Negras

Ela me olha desde a cama, e seu olhar tem algo de inquisidor, ainda que com alguma admiração. Despida como está, eu mal consigo encarar seus olhos. Os meus fixam-se no contorno arredondado de seus seios e nas gotas de meu suco que ali ainda jazem. Displicentemente, ela acaricia a superfície superior do pé esquerdo com os dedos do pé direito, não sei bem se ela nota minha atenção voltada para esse simples gesto capaz de me colocar novamente em pleno estado de excitação, mas entrelaça os dedos uns nos outros pressionando-os com força e depois os solta e deixa os pés relaxarem sobre o colchão, em atitude de gozo. Foi nesse instante que meus olhos de relance alcançaram os seus, da maneira como eu havia dito antes, olhos que perscrutam. Desviei o olhar, temendo revelar algo que não fosse permitido. Nem todo tipo de intimidade seria permitido naquele momento. Alguns pensamentos devem permanecer resguardados de maneira a conservar, digamos assim, o sex appeal que a atmosfera incita. Ela seguia interrogativa. Minha borboleta de asas negras, a fonte de águas venenosas da qual bebi e tornarei a beber, respira sua respiração pesada que fazia mover seus belos seios rosados, a cabeça apoiada sobre o braço e as pernas ligeiramente abertas, ela me devorava com os olhos, a mim, ocupado em fingir que não olhava para mim mesmo enquanto dirigia os olhos para ela. Tendo bloqueado seu acesso ao essencial, eu sei que ela se perguntava o que sentia o tipo a sua frente. E foi assim que, junto à janela, apaguei o meu cigarro no fim, sorri o sorriso nervoso dos famintos, sentia o sangue tornar a enrijecer meu pau e atirando-me sobre ela, segui ocultando o que ela buscava descobrir, a saber: A paixão.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Flores aos Amantes que Fracassaram



Um homem que amou cometeu um suicídio por noite.
Não chorou, porque homens não choram.
Não na frente de terceiros.
Não na frente dela.
Um homem que chorou, ele tem seus motivos.
Mesmo que ninguém entenda,
Ainda que ninguém acredite.
Santo ou canalha,
Herói ou impostor,
Roto ou elegante,
A sós com sua dor
Este homem que amou, que sentiu
Que gozou, chorou e mentiu,
Inventou a cada noite uma nova oração
Para pedir todas as noites pela mesma coisa
Que ela seja capaz de escutá-lo em seu silêncio
E chegue qualquer dia, qualquer noite
Talvez no fim de uma tarde
E, desbravadora de seu corpo e conquistadora de seu coração
Ela seja capaz de amá-lo por um instante
E afastar de sua casa a temível tempestade.

terça-feira, 23 de julho de 2013



Pintura: Eric Fischl [sem título]


No meu trabalho como escritor, eu só fotografo, em palavras, o que vejo. [...] Meus dias, meus anos, minha vida viu altos e baixos, luzes e trevas. Se eu escrevesse só e continuamente da "luz" e nunca mencionasse o outro, então como artista eu seria um mentiroso".


C. Bukowski.

domingo, 21 de julho de 2013

Buenos Aires y la Nostalgia



"De los porteños se podrá decir que no hemos hecho gran cosa y a lo mejor es cierto, pero nadie nos quita la fiaca, madre de la poesía, amiga de la silla en la vereda y de tanto mate amargo"
                                                                 
                                                                                         - Julio Cortázar, "Buenos Aires, Buenos Aires.

"Dos portenhos poderá se dizer que não temos feito garnde coisa e talvez seja verdade, mas ninguém tira de nós a preguiça, mãe da poesia, amiga da cadeira na varanda e de tanto mate amargo".

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Sob o Tapete Vermelho




Banda: Ludovic.

"Saiba que eu lembro bem de cada frase dita,
De cada passo em falso, de cada pequena encenação.
Sobrou alguem que você não condena?
alguem que você se arrepende de ter deixado pra trás?

Eu quero fugir pra onde ninguem me conheça
Retomar a minha vida do ponto onde ela parou.
Bondade sua ouvir tão desatenta
Queixas do lado mais fraco,
De quem não se recompôs.

Que estendam o tapete vermelho
Que comece o desfile de mágoas.

Sem sequelas, sem qualquer problema
Só as marcas de abandono que ardem em tudo
Em que você já encostou".

segunda-feira, 15 de julho de 2013



15 de julho é o aniversário de nascimento de Ian Curtis. Se estivesse vivo, ele faria hoje 57 anos, mas, ele morreu aos 23. Se não deixou uma obra assim tão impressionante, ela foi seguramente marcante pra grande parte dos que estiveram em contato com ela. Joy Division foi uma descoberta importante demais pra mim para que eu me esqueça. Para o bem e para o mal. Afinal, até eu reconheço que dançar ouvindo Disorder ("I've been waiting for a guide to come and take me by the hand/Could these sensations make feel the pleasures of a normal man?") não é algo lá muito saudável. Mas me lembro de quando comprei e escutei o vinil de "Unknown Pleasures", e um mundo de certa maneira se abria. Havia ali um cantor de rock interessado em expor certas obscuridades e dores não à maneira de um Kurt Cobain, mas de um esteta das sombras do espírito humano. Muita coisa na minha vida teve a ver com Joy. Meu primeiro romance com uma garota esteve intimamente ligado a essa banda, com toda intensidade e, digamos, "morbidez" que isso acarreta. Lembro de um dia em que ouviamos Joy Division no quarto a noite toda, enquanto os tiros pipocavam lá fora e nós aumentávamos o som para abafar esse barulho. Essa indiferença, se não nos tornava as pessoas mais corretas do mundo, não nos fazia de maneira alguma insensíveis ao que acontecia. Mas nossa fascinação com o horror nada tinha de parecido com essa das pessoas que sentam à mesa na hora do almoço assistindo o banho de sangue dos noticiários policiais. Nos abraçávamos e sentíamos por toda a dor à nossa volta, mas ao nosso modo, torto. Era um interesse profundo em toda sorte de mazela que transformava-se em musica e não passava despercebido em nossas almas. Hoje, mesmo não escutando tanto a sua musica, ela ainda me leva de volta a episódios relevantes de minha vida. "O passado é um lugar estranho", diria Morrisey. E eu bebo a isso. Espero que você tenha encontrado sua paz, Ian.

And dance for the radio.



"Escute o silêncio, deixe-o soar.
Os olhos, lentes cinzas escuras com medo do sol.
Teríamos um momento bom vivendo a noite,
Deixados à destruição cega,
A espera de nosso olhar.

Nós poderíamos seguir em frente como se pensássemos que nada está errado
Escondidios destes dias, permanecemos sozinhos,
Ficando no mesmo lugar, simplesmente fora do tempo
Tocando à distância,
Mais longe a cada momento.

Bem, eu poderia chamar quando as coisas ficarem difíceis
As coisas que aprendemos não são mais suficientes
nenhuma linguagem, apenas o som,
É tudo que precisamos saber para sincronizar o amor
À batida do show.

E dançar, dançar, dançar, dançar para o rádio".


"I held her close and kiss in our last kiss..."

Desenho: André Kitagawa.

domingo, 14 de julho de 2013

Foi meio que esperar ansiosamente por meses pela chegada do inverno e quando isso finalmente acontece, continua tão quente quando o resto do ano. E com direito a tempestades violentas nos piores dias. Fazer da vida uma longa espera pode ser uma tática covarde de distanciamente, mas para algumas almas não existe outra solução. Tendo dito isso, que fique claro que esse não é o meu caso. Eu não tenho que esperar por nada, se espero, ainda é por algum resquício de esperança de que não há de ser sempre assim e é por isso que eu adio as mudanças drásticas que se impõe e que me trarão tantas perdas mas também alguma paz e tranquilidade. Não é para fazer sentido mesmo. Ontem à noite tive a oportunidade de experimentar um pouco desta paz que se anuncia e que espero trazer para os meus dias, ainda que para isso matando um pouco daquilo que tanto aprecio em mim. Tudo aquilo de que mais me orgulho está fora de mim, está projetado em outros lugares e fazer isso é tão venenoso quanto entregar-se a esperar, esperar e esperar. E acredito que agora consigo ficar até feliz por pensar assim.


Musica "Ganas de Vivir", de Juan Suarez
Cena do filme "El Mariachi".
Afeto de bêbado
Simpatia de vendedor
Sorriso de modelo

Entrevista de jogador
"É logo ali" de mineiro
Promessa de cheirador

Reza um rosário inteiro, jura por nosso senhor
Que as mentiras mais sagradas
São verdades de amor.

(7 Capetas)


quinta-feira, 11 de julho de 2013

A esta Gal, me rendo.




Minuano


Eu não sentirei mais frio.
No mínimo, ele não doerá mais tanto;
Aponto os refletores para mim e sua luz,
Que me ilumina e me aquece
que exibe meus defeitos  e belezas
que me destaca e me ofusca há de ser um candeeiro
Nas noites frias e chuvosas que me ameaçam com seus trovões
E eu me exibo sem pudor sob a luz de um milhão de sóis e ainda assim
Mais delicada que uma vela
Numa casa sem eletricidade.

Não sentirei mais esse frio,
esse frio particular e denso
Que cai mesmo nos dias mais quentes,
Pois tenho esse sorriso que me acolhe
Essas palavras que me alcançam no fundo do poço
Na calada da noite
Nas entranhas do tempo e
nas entrelinhas do verso perdido entre papéis empoeirados.

Sentirei antes o frio que é nostalgia, saudade
O frio que é encanto
E a solitude num canto qualquer da cidade.
Mas este frio que é falta de carinho, de atenção
De um gesto de delicadeza qualquer,
Esse eu não mais sentirei, determinado que estou
A fazer destes meus pequenos erros diários
Uma fogueira onde a inocência queime como o mais puro dos combustíveis.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Um Pequeno Sopro de Você



Você se lembra de quando Satanás te tirou pra dançar e você, sem ter outra escolha, saiu para trocar alguns passos com ele? Eu murmurei um lamento quieto, resignado, pois sabia que aquilo não era o que você merecia. Trancado em mim mesmo, eu esperei o seu retorno, pronto para cuidar de suas feridas tão logo você voltasse de sua temporada no inferno, preparado para não permitir que ficassem sequer cicatrizes daquele encontro. Mas você não permitiu que eu me aproximasse com meus unguentos e curativos. E você se lembra de quando, solitários mas não inocentes, nos trancamos no quarto ouvindo o caos do outro lado da parede, festejando com jogos eróticos a sagração da primavera e desejando a todos do lado de fora o torpor que sentíamos em nossos corpos, rindo de nossa solidaderiedade canhestra? Você lembra das cartas que eu pus em garrafas atiradas ao mar ciente de que chegariam ao destino mas sem saber ao certo de suas respostas? Eu escrevia-as com certa displicência, mas era meu coração que eu colocava ali, sem medo das agulhas que o atravessariam uma vez derramado meu sangue no papel. Você se lembra das noites e dos dias, dos corredores, dos olhares indiscretos? Da pólvora, dos gritos, dos olhares indiferentes, do gosto de sangue e saliva, de que tudo ali que era mesquinharia mas ainda assim permeado de carinho? E dos felinos estremecendo e inquietando-se diante de nossa passagem, você se lembra? Você se lembra que poderíamos em algum momento ter sido nós dois, mas preferimos continuar eu e você, a despeito do incêndio causado pelo calor de nosso encontro? Se escrevo estas memórias, é porque esta canção não estará na boca de ninguém. O fim do mundo está tão próximo e me dói pensar que não o festejarei adequadamente, isto é, a seu lado.

Foto: Francesca Woodman

Deixa eu bagunçar você

Durmo na esperança de sonhar contigo Acordo somente pro desejo de te encontrar Menos que obsessivo, meu amor por você é abrigo ...