terça-feira, 7 de maio de 2013


“O senhor está olhando para fora, e é justamente o que menos deveria fazer neste momento. Ninguém pode o aconselhar ou ajudar – ninguém. Não há senão um caminho. Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma; confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever? Isto acima de tudo: pergunte a si mesmo na hora mais tranquila de sua noite: “Sou mesmo forçado a escrever”? Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples “sou”, então construa sua vida de acordo com essa necessidade. Sua vida, até em sua hora mais indiferente e anódina, deverá tornar-se o sinal e o testemunho de tal pressão. Aproxime-se então da natureza. Depois procure, como se fosse o primeiro homem, dizer o que vê, ama, vive e perde. (...) Se a própria existência cotidiana lhe parecer pobre, não a acuse. Acuse a si mesmo, diga consigo que não é bastante poeta para extrair suas riquezas. (...) Se depois desta volta para dentro, deste ensimesmar-se, brotarem versos, não mais pensarás em perguntar seja a quem for se são bons. Nem tão pouco tentará interessar as revistas por esses seus trabalhos, pois há de ver neles sua querida propriedade natural, um pedaço e uma voz de sua vida. Uma obra de arte é boa quando nasceu por necessidade. Neste caráter de origem está o seu critério – o único existente. Também, meu prezado senhor, não lhe posso dar outro conselho, fora deste: entrar em si e examinar as profundidades de onde jorra sua vida; na fonte desta é que encontrará resposta à questão de saber se deve criar.”

Rainer Maria Rilke - Cartas a Um Jovem Poeta (Trecho da primeira carta)

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