terça-feira, 16 de novembro de 2010

Versos para uma advogada de respeito

Minha doce amiga,
Do alto de seu irretocável sucesso, 
Peço agora que advogue em meu favor,
Eu, o filho torto da ninhada.
Lembre-se, pois:
Nós vimos o futuro naquela tarde abafada
No sótão da sua casa.
Velvet na vitrola, “heroin” nas nossas veias,
E você me dizia do marido perfeito e dos muitos filhos que teria um dia.
Eu só dizia dos filmes de terror que iria assistir
Naqueles dias de ressaca fodida;
E dos empregos que chutaria, só pra aproveitar o dia de chuva.
Nossos dias heróicos.
Aquela camiseta do nirvana que você não tirava,
A alça preta do sutiã sempre à mostra, eu de óculos escuro
No sótão.
Entre os discos, as garrafas, as abelhas
(de onde vinham aquelas abelhas?)
Esses pequenos objetos testemunharam nosso dom premonitório,
E algumas outras cenas, também.
Todos os dias, você tinha um corte novo no braço
E eu tinha que fingir não ver para você não chorar.
Aquele sótão empoeirado que você não limpava.
Aquele ventilador quebrado.
Aquelas transas que, para começar, esperávamos
Que começasse antes o barulho dos carros na oficina do teu pai;
Porque você gemia alto e os vizinhos eram curiosos.
Lembro-me de tudo isso.
De como previmos nosso futuro
Naquelas tardes quentes e heróicas.
Aquele pequeno poema riscado na parede,
Eu ainda me lembro:
“Guardemos com carinho
A dureza destes dias escuros,
Pois teremos dias de fartura,
Mas então já não teremos um ao outro”.

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