quarta-feira, 31 de março de 2010

Naked


Holden Caufield, o garoto mal-humorado de “O apanhador no campo de centeio”, cresceu, e sua acidez com o mundo e as relações humanas não diminuíram, se transformaram em cinismo e niilismo convictos. E ele não conseguiu um emprego. Chama-se Johnny agora, caminha por entre lugares perigosos, negocia com estranhos, vai da ternura à violência sem aviso prévio. Não procura por padrões ou sentido em seus atos. Apenas é, e vai se tornando ao mesmo tempo em que está sendo. Johnny, com seus atos, desnuda as pessoas que sentem-se inevitavelmente atraídas por ele, vítimas de uma sociedade baseada em leis morais incompreensíveis, uma moral que as jogaram no lodo onde elas estão e que diz que elas devem ficar onde estão pois a culpa é só delas. Uma moral feita e mantida por elas mesmas.
Naked, filme do inglês Mike Leigh, é político sem maniqueísmo ou ideologismo barato. Se fosse marxista, Johnny se sensibilizaria com os “desafortunados” do capitalismo e direcionaria seu desprezo à “classe dominante”, no entanto, assim como o mundo real não se divide entre oprimidos e opressores, nada aqui é preto e branco. Fica claro que, no caminho para a degradação, um forte componente humano entra, algo bem mais simples do que o argumento de que o “ambiente” constrói as pessoas, ou de que cada um é levado até lá por decisões racionais próprias. Nem Zola seria tão realista. Nenhum tratado sociológico descreveria (e é por isso que a sociologia deveria cuidar do que é seu domínio, e não especular sobre a natureza humana sendo incapaz de fazer isso. A arte o faz muito melhor).

Johnny: "Você não faz uma omelete sem quebrar alguns ovos. E a humanidade é um ovo quebrado. E a omelete fede". Uma doçura, não?


O que acontece em Naked é sobre pessoas que vivem vidas comuns, de poucas perspectivas além da de sobreviver por mais um dia, e como não há nada mais humano que errar, tomam as decisões erradas (se você pensar que o certo é querer melhorar sua condição) e assim sedimentam o caminho para a auto-destruição. E Johnny não está nem aí. Ele é o profeta da desgraça, e não se diverte nem se lamenta por isso. Ele sabe que a culpa é e não é dele. Ele aposta, o tempo todo. Mas ele ainda é um cara perdido, assim como Caufield, e como muitos homens, sensível sem saber como dizer que precisa de afeto. E não entendam isso de maneira piegas. Essa dificuldade em comunicar sentimentos existe, faz parte, também é fração da desgraça em que mergulhamos. E aqui entra uma questão de gênero que não pretendo desenvolver aqui. O certo é que o dramaturgo Mike Leigh fez um filme adulto, como é difícil ver nos dias que correm. Sua formação no teatro é fundamental para impedir nossa empatia com os personagens, deixando-os flutuando e que fique por nossa conta simpatizar com um ou outro. Todos são vítimas, e todos são artesãos de seus próprios infortúnios.

segunda-feira, 29 de março de 2010

O Futebol de Armando Nogueira

Por Roberto Vieira

Os três maiores cronistas do futebol brasileiro.
Agora batem bola na eternidade.
Primeiro se foi nosso Friedenreich:
Mário Filho.
Palavras e toques exatos, milimétricos.
Inventor do futebol fora das quatro linhas.
Depois partiu seu irmão, Nelson Rodrigues.
Garrincha de frases cortantes e desconcertantes.
Sempre driblando pela direita.
Até que a realidade mostrou-se surda.
Hoje se foi Armando Nogueira.
O menino de Xapuri.
Terra da borracha, da riqueza e da miséria.
Terra onde o menino corria atrás de uma bola.
Nos campinhos na beira do rio.
Armando que foi a síntese da poesia no futebol.
Armando que se deslumbrou com Heleno de Freitas.
Armando que fazia da pauta, latifúndio.
Armando que tal e qual Nilton era muitos sendo um só.
O futebol é jogado com os pés e feito de gols.
Mas se o futebol tem alma.
A alma do futebol está na sua poesia.
Poesia que brota das letras de quem ama o futebol-sonho.
Hoje a poesia do futebol está em silêncio.
E vai permanecer assim por algum tempo.
Pegando carona no também lendário Drummond.
Difícil não é escrever mil poesias como o Armando.
Difícil é escrever uma só poesia como Mestre Armando Nogueira.

quarta-feira, 24 de março de 2010

segunda-feira, 15 de março de 2010

Isto é, tipo, muito antigo

OEstrangeiro

Às vezes me invade como o exército alemão marchando sobre Paris quando estou triste;
Às vezes é pura escuridão, em seu silêncio sagrado.
Às vezes é como fazer sexo num dia de chuva;

Às vezes são dez mil olhos me observando de todas as paredes;
Às vezes é só a TV;
Às vezes é um rosto desconhecido e apavorado do outro lado do espelho;

Às vezes é desconfiança;
Às vezes é celebração;
E às vezes é dor, sim;

Às vezes me procura como um braço decepado atrás do resto do corpo;
Às vezes me abandona como uma ex-dona de casa livre para a vida;
Às vezes me atrai como a inocência que atrai o pedófilo;

Às vezes são crisântemos amarelos;
Às vezes é uma orquídea;
Às vezes uma violeta que resplandece no outono;

Às vezes a fúria do rock’roll;
Às vezes o lamento de um blues;
Às vezes, o surrealismo de Lynch;

Às vezes eu quero esquecer;
Às vezes estou envolvido demais;
Às vezes são ruas escuras por onde me perco quando procuro por tua mão;

Toda noite a noite me diz que “isso” é apenas uma volta ao lar,
E eu carrego bombas com as quais destruirei monumentos,
Pois o lar para onde o “isso” da vida me leva
Leva muito tempo para alcançar.
Às vezes ele se parece com uma canção anarquista espanhola,
Outras vezes ele me vem como teu sorriso.
Às vezes é viver dentro de tudo e ter tudo existindo dentro de mim.

domingo, 14 de março de 2010

Quando você menos espera, eles voltam

E aí, justamente quando tudo parece mais calmo, aquele temor, aquele desespero, parecem estar de volta, ou ao menos querendo retornar, apenas para lembrar que eles estão sempre ali, a espreitar. Temor de viver pela metade, desespero em não perder mais nenhum minuto... E cada erro, cada frustração, me leva um passo mais próximo desses meus algozes. O lado mais sombrio de meu cérebro nunca pára de funcionar, e isso é um drama.

sábado, 13 de março de 2010

Esquizofrenia


 Esquizofrenia é uma doença mental que se caracteriza por uma desorganização ampla dos processos mentais. É um quadro complexo apresentando sinais e sintomas na área do pensamento, percepção e emoções. Nesse quadro a pessoa perde o sentido de realidade ficando incapaz de distinguir a experiência real da imaginária. Essa doença se manifesta em crises agudas com sintomatologia intensa, intercaladas com períodos de remissão, quando há um abrandamento de sintomas, restando alguns deles em menor intensidade.




Alguns sintomas incluem: Delírios - o indivíduo crê em idéias falsas, irracionais ou sem lógica, percebe estímulos que em realidade não existem, como ouvir vozes ou pensamentos, enxergar pessoas ou vultos, podendo ser bastante assustador para o paciente; fala de maneira ilógica e desconexa , demonstrando uma incapacidade de organizar o pensamento em uma seqüência lógica. O paciente esquizofrênico tem um "afeto inadequado ou embotado", ou seja, uma dificuldade de demonstrar a emoção que está sentindo; e alterações de comportamento”.

Assustador, não? Eu tenho meus dias ruins, mas não chegam a isso não. Mas a possibilidade de surtar é terrível. Quem vai me resgatar se eu me perder nos porões da minha mente? Dizem que lá vivem criaturas más, e grotescas. A realidade, por mais absurda que seja às vezes, ainda me reserva alguns prazeres. Lá, não. Não quero ir prá lá. Não quero voltar lá. Deixem-me aqui. O lar da paranóia e do delírio é decorado com ossos e sangue, a violência dos instintos não demora a se manifestar quando você precisa se defender de medos que não existem de verdade. Ou que talvez existam, mas você você os havia deixado guardados. Deve haver um meio de lidar com isso, antes de parar numa cela de paredes brancas acolchoadas. Ah, isso é coisa de filme norte americano. Os hospícios aqui são mais sinistros, não? Então, repito: Deixem-me aqui, prometo me comportar. Eu sou a violência incontida da mente do Jack...

E tudo isso porque ontem assisti o “Shutter Island”...



“Mas eu não quero encontrar com gente louca!”, observou Alice.
“Você não pode evitar isso” – Replicou o gato.
“Todos nós aqui somos loucos. Eu sou louco. Você é louca”.
“Como sabe que eu sou louca?” Indagou Alice.
“Deve ser”, disse o gato, “ou não teria vindo aqui.”

                                LEWIS CARROL – Alice no país das maravilhas.



segunda-feira, 8 de março de 2010

Retornos, II - Subterranean Homesick Alien




A brisa da manhã, eu permaneço esquecendo.
O cheiro do ar morno de verão. Eu vivo numa cidade em que
Você não consegue sentir o cheiro de nada
Você vê seus pés em buracos no cimento.

Bem lá no alto, aliens sobrevoam
Fazendo filmes caseiros para o povo de sua terra
Sobre todas essas estranhas criaturas que trancam seus espiritos
Furam buracos em si mesmos e vivem para seus segredos...

Eu desejo que eles baixem numa avenida da cidade
Tarde da noite quando eu estiver dirigindo.
Me levem a bordo de sua bela nave, me mostrem o mundo
Como eu adoraria vê-lo.
Eu contaria para todos os meus amigos,
Mas eles nunca me acreditariam. Eles diriam que
Eu me perdi completamente.
Eu os mostraria as estrelas, e o sentido da vida.
Eles me calariam.
Mas eu ficaria bem....

domingo, 7 de março de 2010

Retornos, I

Esse lugar está em chamas. Ainda que chova tanto. No underground, acontece de tudo. E há fantasmas de todos os tipos quando a noite cai. Esse lugar é quente feito o inferno.E sempre que volto aqui, há uma garrafa de qualquer coisa forte me esperando. E pessoas, anjos, demônios, todos eles me oferecendo seus carinhos.Dobre a esquina certa em Sin City e você pode encontrar de tudo. Esse lugar, a qual sempre volto e sempre voltarei, esse lugar está em chamas. Meu coração sangrento.

terça-feira, 2 de março de 2010

Registro de uma tarde


Edward Hopper - Eleven A.M



P/ Camila.

Bolo de cenoura experimental;
Mate gelado-lima limão;
Café bamboo:
Garçon- Dois cafés-expressos duplos, por favor!
Garota angustiada;
Uma locadora que vai fazer falta;
Anjo-da-guarda dormindo, pé torcido;
Sacola de gelo;
Fernando Pessoa está só,
Como ninguém jamais esteve,
Mas não o acompanho em sua solidão: estou feliz;
Radiografia, não há de ser nada;
Carona;
Chuva fina. Cigarro na janela;
Meu fim de tarde valeu pelo dia inteiro.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Tempo, tempo....

Depois de meses, você a reencontra e percebe que se passaram apenas dias. O tempo é uma ilusão, ainda que com poder de dissolver tudo, de transformar superfícies calmas em mares revoltos, ainda assim um alucinógeno que não faz mais do que distorcer nossa percepção. Não se passaram anos, nem meses. Foram dias. Pense em quantas ligações que não foram atendidas. Elas não foram sequer feitas. Pense em quantas cartas jamais chegaram. Elas agora chegarão. Pense naqueles tristes cafés em manhãs melancólicas. Elas nunca existiram. Porque o dia da partida foi ontem, e você está enfim de volta. Não demorartá, e você partirá de novo, antes que possa deixar corações partidos na estação rodoviária, e quando isso acontecer já será outro carnaval, e mais um pôr-do-sol na praia. E sua terra verá seu retorno triunfante mais uma vez. E ela estará aí, ou em algum outro lugar, mas sem longas separações dessa vez, porque você sabe que ainda que o tempo devore e não pare, ele desliza devagar para aqueles que zombam dele, dançando na corda bamba. O tempo não mata. O tempo não cura. O tempo só existe para o que não dura.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

O Silêncio

Sete horas da manhã definitivamente ainda era muito cedo pra mim, depois de uma noite tão agitada. Mas já fazia mais de uma hora que eu estava deitado naquela cama, e isso me angustiava. Meia hora depois de me levantar, aquelas duas garotas que dormiram ali comigo estavam também de pé, observando todos os meus gestos silenciosos, lentamente colocando o pó na cafeteira, ligando o fogo, lavando o rosto na pia, tudo isso em um silêncio quase ritual, meus pés descalços tocando o chão delicadamente sem tirar dele nenhum som abafado, o abrir e fechar de gavetas sem barulho algum.  E elas respeitosamente mantinham-se em silêncio. Uma das duas, a morena de olhos claros e cabelos curtos, me perguntou se eu fazia aquilo para não desperta-las. Respondi que, na verdade, não. Eu estou sempre surpreendendo as pessoas, entrando silenciosamente nos quartos como se não houvessem portas fechadas, sempre mais ou menos calado. Esse sou eu, e se sou assim é porque descendo da linhagem dos Silenciosos, uma antiga estirpe de indivíduos que se encontram a vontade com o silêncio absoluto que existe dentro de nós, o silêncio que nos dita o rumo, o silêncio que acreditamos que é a única coisa que existe depois de morrermos, silêncio e vazio, o silêncio misterioso dos espelhos e dos cômodos vazios das casas, enfim, o silêncio do fundo do mar onde o som se propaga com dificuldade. Nossa postura de reverência ao silêncio é ao mesmo tempo uma exaltação do mistério. Essa capacidade que me acompanha desde cedo, de ficar em silêncio mesmo em meio ao barulho mais extremo, é herança desses ancestrais. Meus antepassados, talvez índios da linhagem de minha bisavó materna, obrigavam-se a passar longos períodos sem dizer palavra alguma, evitando qualquer forma de barulho vulgar. E quando esse período se acabava, celebravam-no com uma grande festa. É por isso que eu jamais quebro o silêncio. Quando tenho de fazê-lo, despedaço-o. Ao som de rock and roll.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Café da manhã com Nossa Senhora das Lágrimas


Hoje caíram algumas gotas de essência de melancolia na minha xícara de café. Fiquei sem saber o que fazer, olhando para o fundo da xícara, desatento, distante, atônito como um esquizofrênico tocado pelas mãos frias do Silêncio. Fiquei ali, olhando. E o tempo não parecia mover-se. Fiquei imóvel porque tive medo do que poderia acontecer se me movesse diante daquele fenômeno tão misterioso que se desenrolava à minha frente. As gotas se dissolviam lentamente, seu brilho aperolado diminuía em contato com o negro amargo ancestral que ritualisticamente bebo todas as manhãs, até que todo o conteúdo agora se revestia de um brilho escuro de uma noite absolutamente sem seus adornos, a lua e as estrelas. Eu fiquei ali, estava fascinado. Como meu próprio medo me fascina! E se eu tomasse aquela poção mágica? Que segredo subitamente se revelaria para mim? Quais as conseqüências de tamanha ousadia? Café com tristeza, num dia lindo de sol? Qual tribunal me julgaria por isso? Quais anjos seriam mandados para me salvar? Existirá salvação? A atração pelo abismo, é isso que me faz amante do Mistério e irmão de toda Dor? Determinado, mas não sem receio, começo a aproximar a xícara de meus lábios. Desafio o aroma, sinto o cheiro daquelas madrugadas esperando a ligação de uma garota muito distante cheia de tristeza e doçura, sinto que estou me aproximando da toca do coelho, no fim das contas. Toco a borda dela com os lábios, delicadamente, como se fossem os lábios de minha amante imaginária, meu doce fantasma. Não é a ausência de luz nem de brilho que me cativa, mas a capacidade de tratar as sombras com ternura. Um gole apenas, o café antes frio agora desce como conhaque, a xícara cai de minhas mãos e se despedaça em contato com o chão; nunca tive nenhum motivo para acreditar que minha aventura daria certa e ainda assim cheguei até aqui; meus olhos contemplam o sol entrando pela janela, mas eu vejo muito além. Estou suavemente me entregando, pouco a pouco desafiando a minha própria descrença, enquanto em algum lugar de minha alma algo parece quase se alegrar...

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Vitória


Vitória,
Meus dedos delicados de querubim
Uma vez tocaram sua terra úmida
No local onde anjos negros foram enterrados,
Seus mortos são meus mortos
E eu delicadamente imploro
Que você os deixe beijar-me nos olhos
Para que sua memória fique em mim
Como uma marca de batom cinza-escuro
E desapareça aos poucos como a paixão em meu corpo.

Vitória,
Eu te deixo esses versos, mas eu não te amo.
Nos meus sonhos, tu és uma víbora
Que me ameaça com um veneno doloroso;
Em meus sonhos, 
Estou sempre navegando para longe de suas praias.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Desolation Row


Agora a lua está quase escondida
As estrelas estão começando a se esconder
A moça que lê a sorte
Até levou todas suas coisas para dentro
Todos exceto por Caim e Abel
E o corcunda de Notre Dame,
Todos estão fazendo amor
Ou então esperando a chuva.
E o Bom Samaritano, está se vestindo
Ele está se preparando para o show
Ele está indo para o carnaval essa noite,
Na Fileira da desolação.


- Bob Dylan


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Chales Bukowski

um bom poema é algo que
te permite andar pelas ruas
da morte,
um bom poema pode fazer a morte
derreter feito manteiga,
um bom poema pode enquadrar a agonia e
pendurá-la na parede

- trecho de poema sem título.

domingo, 31 de janeiro de 2010

Pergunta-me



- Mia Couto.

Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue

pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos

pergunta-me
se te voltarei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo a folha rasgada
na minha mão descrente

qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

E eu continuo viciado nesse filme...




Acontece que, até hoje, o personagem cinematográfico por quem eu tinha maior afeição, ainda era o Freaky Edward, de “Edward Mãos-de-Tesoura” (seguido bem de perto por Hannibal Lecter). Sua doçura de monstro que fica sozinho após a morte do criador, sua bondade apesar da aparência soturna, seu estilo Frankstein, me cativara (meu MSN não me deixa mentir). Mesmo esse não sendo mais um dos meus filmes preferidos, o personagem e minha identificação com ele permaneceram. Não só Ed era gracioso em sua imperfeição, mas a atitude da cidade em relação a ele me aproximava dele. Acontece que hoje uma menininha tomou esse lugar. Diria que se trata de uma paixão esquisita minha. Eli, a vampira de Doze anos de idade, de “Deixa ela entrar”, me tocou. Ed era meu duplo quando eu tinha treze anos. Eli é apaixonante em sua solidão e sua sede. Com ambos me identifico, mas era a Eli que eu me dedicaria a passar a vida conseguindo sangue humano para poupá-la dos dolorosos assassinatos. Eli é uma vampira. Tem doces olhos injetados de sangue, parece indefesa mas é uma assassina. Conhece a ternura dos que só têm a noite como companhia e dos poucos corações solitários que cruzam seu caminho.
Eli, você pode entrar.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Jogos, mentiras, sussurros... sirva-se.


Conte-me mentiras com a calma dos covardes.
Não há nada errado nisso.
Minta com a consciência limpa
Minta sem fazer sério juízo;
Vivo, se um dia topei esse jogo, não foi na esperança de ganhar,
Mas só pra ter o Valete em minhas mãos.
Mas, se você não sabe jogar,
Se você não sabe jogar,
Restam os ases da mentira, pontas-de-lança
Desse jogo perigoso, eu sei,
Criminosos do acaso somos todos
Doces venenos em copos de Whisky, já tomamos,
De duros golpes que partiram nossos ossos,
Nos recuperamos;
Então por que não mentir?
Com prazer sádico, como Caetano:
Pra que rimar seu amor com minha dor?
Não minta pra mim:
Este jogo um dia vai ter fim?

E ela disse, temendo dizer a verdade:
“Um dia, um dia, um dia...”
E cruzes surgiram na areia da praia,
Duros espinhos brotaram em meus braços
E uma violenta tempestade de areia se instalou
Sobre minha cama,
Eu nunca fui tão feliz outra vez.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Deixa Ela Entrar




É muito gratificante, em tempos de “Crepúsculo” e “Lua Nova”, ver um filme de vampiro em que está presente algo tão simples como o princípio de que um vampiro não pode entrar num local particular sem ser convidado. Além de demonstrar inteligência e conhecimento do assunto, é uma prova de elegância maior, ao escolher um título que faz referência a esse aspecto da mitologia vampírica, que está longe de ser um detalhe. Explico: O filme sueco é um filme delicado, e, mesmo quando violento, poético. Pertencendo à longa tradição dos bons filmes de vampiro, “Deixa ela entrar”, do diretor sueco Tomas Alfredson dá atenção à atmosfera, fotografia, cenas e coloca lirismo onde poderia haver só uma estorinha de horror. O vermelho, cor do sangue que alimenta Eli, é poupado no filme e aparece poucas vezes para lembrar de que se trata a estória. Eu sentia arrepios quando via um objeto vermelho. O filme tem cenas memoráveis, inclusive uma que remete à cena do dedo cortado em “Nosferatu”. E lindas cenas dos personagens centrais juntos, Oskar, um garotinho introvertido, perseguido no colégio e fissurado por crimes violentos; e Eli, a vampira que já tem doze anos de idade “há muito tempo” e vive sua maldição apenas contando com seu suposto pai para ajuda-la. E a utilização da maldição vampírica para tratar de temas humanos também aparece. Aqui, são o medo e a solidão de duas crianças, e o carinho e a ternura surgindo de lugares mais improváveis, a doçura dos dois contrastando com a situação terrível em que eles (Oskar e Eli) se encontram. O filme nunca fica agridoce, tudo funciona perfeitamente em paradoxos, dos sustos às declarações de amor tão mórbidas quanto inocentes, ao delicioso final com gosto do sangue.
Um filme inesquecível. Poucas sensações são tão boas quanto ver as luzes se acendendo, olhar para trás e ver o projetista e estar um pouco mais feliz por estar vivo.


Deixa eu bagunçar você

Durmo na esperança de sonhar contigo Acordo somente pro desejo de te encontrar Menos que obsessivo, meu amor por você é abrigo ...